História da Polícia Militar


POLÍCIA

É intrínseco do Homem viver em sociedade, contudo, a sociedade ao gerar interações gera também conflitos. Para vencer esses conflitos foram criadas regras que, ao serem obedecidas, minimizam as pendências. Para gerenciar essas regras, se fizeram necessários mecanismos que variam de acordo com o tamanho da sociedade.

Numa sociedade tribal, o chefe do clã tem condições para administrar as regras e fazê-las cumprir. Contudo, na medida em que a sociedade cresce, passa a ser imprescindível a ação de agentes de coerção mais eficazes, pois, a partir de determinado momento as ações dos indivíduos não podem ser controladas tão somente por um chefe. É nesse momento que surge a organização denominada Polícia.

Polícia é um vocábulo de origem Grega (politeia), e passou para o Latim (politia), com o mesmo sentido: "governo de uma cidade, administração, forma de governo". Todavia, com o passar do tempo, assumiu um sentido particular, "passando a representar a ação do governo, enquanto exerce sua missão de tutela da ordem jurídica, assegurando a tranqüilidade pública e a proteção da sociedade contra as violações e malefícios".

Polícia é um organismo criado pelo grupo para garantir a coesão e o bem comum da própria Sociedade.

A Polícia é uma instituição universal, não havendo grupamento humano que a prescinda, dentro de uma forma ou de outra.

O progresso do conhecimento e da humanidade criou compartimentação para o sentido de Polícia. Tem-se hoje polícia administrativa, polícia judiciária, alfandegária, federal, fiscal, etc. São, contudo, ramos de um mesmo setor do Estado, cuja missão final é a preservação da ordem e da segurança dos cidadãos.

No Estado de Mato Grosso, para exercer a polícia administrativa, existe a Polícia Militar, organização a caminho do tricentenário, sempre presente lado a lado com os Mato-Grossenses em todas as manifestações cívicas e sociais destes gloriosos anos de existência de nossa Corporação.


HISTÓRIA DA POLÍCIA MILITAR BRASILEIRA

As origens das Polícias Militares se confundem, muitas vezes, com a história das Forças Armadas do Brasil.

As primeiras expedições se destinavam muito mais a patrulhar o litoral do que propriamente a colonizar. No entanto, foram instaladas feitorias ao longo da costa, deixando-se colonos para garantir a posse por Portugal. Esse colonos exerciam um papel múltiplo. Eram lavradores, membros de uma força de defesa e policiais.

Posteriormente passaram a existir três linhas de tropas na Colônia: A primeira que era paga, e tinha por finalidade a defesa externa. A segunda, também paga que tinha a incumbência da segurança interna, ou de polícia. E a terceira, constante de voluntários, que serviam para suprir a falhas das duas anteriores, em efetivos. As três eram compostas por cidadãos que, quando não necessários seus préstimos para a segurança interna ou externa, exerciam suas atividades usuais.

Durante todo o período colonial, embora houvesse essa divisão em "linhas", não havia diferenças estruturais entre tropas de defesa externa e de preservação da ordem interna.

Dado a inexistência de órgãos especializados no serviço de policiamento, os integrantes das segundas e terceiras linhas das Forças Armadas eram normalmente empregados neste serviço, zelando pela segurança e preservação da ordem nos primeiros núcleos populacionais do país e, em nosso caso, sendo responsável pela manutenção da ordem pública, na época ameaçada pela descoberta de riquezas no solo Mato-Grossense, especialmente o ouro.


HISTÓRIA DA POLÍCIA MILITAR DE MATO GROSSO

É bastante conhecido o axioma de que a História da Polícia Militar Mato-Grossense se confunde com a própria história de Mato Grosso, logo, a cultura Policial-Militar é parte viva da cultura Mato-Grossense, esta sim, uma cultura completa na qual a Polícia Militar do Estado de Mato Grosso está inserida.

Para tanto, destacamos as palavras de Tavares (1993, p.58): “A cultura de uma organização não nasce com a sua fundação, ela é constituída ao longo do tempo, evolui com a história da organização e para que as pessoas se identifiquem com esta cultura é necessário a sua permanência na instituição por longo tempo.”

É de elevada importância conhecermos os fatos que fundamentam a criação da Gloriosa Polícia Militar de Mato Grosso, as mudanças históricas ocorridas desde o Período Colonial até os dias atuais, fazendo a Polícia Militar Mato-Grossense ser, na atualidade, o órgão público mais antigo em atividade no Estado de Mato Grosso.

A história da segurança pública em Mato Grosso começou efetivamente após um ano e sete meses da fundação do Arraial do Cuyaba ocorrida em 08 de Abril de 1719, isto é, ainda no período do Brasil-Colônia quando nossa Instituição teve a sua origem em 06 de Novembro de 1720, quando da ocupação de cargo com finalidade policial-militar em função de comando com responsabilidade direta pela defesa local e manutenção da ordem legal e administrativa no Arraial do Cuyaba, fato endossado e ratificado pela Coroa Portuguesa, evidenciado ao longo de sua história e sedimentado em Lei que o declara no percurso do tricentenário da Instituição.

Em plano primeiro é absolutamente imperioso destacar-se a motivação e a necessidade para se reescrever a origem da Polícia Militar do Estado de Mato Grosso, a qual surgiu na Academia de Polícia Militar Costa Verde (APMCV).

Nesta oportunidade faz-se necessário informar que na Academia Policia- Militar Mato-Grossense, em sua matriz curricular, há a previsão do Curso de Gestão Organizacional de Segurança Pública – CSP, estabelecido na legislação pertinente à Polícia Militar.

O referido curso tem parceria com a Universidade do Estado de Mato Grosso (Unemat) e juntas, ambas as Instituições estão habilitadas para atender o cumprimento dos requisitos necessários para o funcionamento daquele Curso de Especialização, em conformidade com a Resolução CONEPE/UNEMAT Nº 003/2007 estabelecida no Regimento dos Cursos de Pós-Graduação Lato Sensu.

Assim, tal Curso destina-se aos Oficiais Superiores da PMMT, Oficiais Superiores do CBMMT, Oficiais Superiores das Co-Irmãs, Delegados da Polícia Judiciária Civil, Delegados da Polícia Federal, Inspetores da Polícia Rodoviária Federal e ainda, autoridades do Judiciário e do Ministério Público, detentores de diploma de nível superior ou equivalente.

Desta forma, o Alto Escalão da PMMT acatou a proposição da direção da APMCV em homologar a pesquisa inédita concretizada pelo então Oficial-Aluno WilameAlves de Almeida – Tenente-Coronel da PMMT, com tema “Polícia Militar do Estado de Mato Grosso: Revisão Legal de Sua Legitimidade na História Mato-Grossense”.

Neste desafio, a produção acadêmica estabelece que construir conhecimentos, criar conexões, relacionar fatos, analisar argumentos, duvidar de algumas verdades, descobrir ou inventar outras são alguns dos movimentos fundamentais da pesquisa, e esta é a base para o desenvolvimento científico.

Dúvidas sempre existiram quanto ao nascedouro da PMMT e cabe à historiografia esclarecer tal indagação. Ubaldo Monteiro da Silva em A Polícia de Mato Grosso História – Evolução (1835 – 1985) apresenta questionamento na referida obra, pág. 13:
(...) do que se verifica nos fastos de Mato Grosso, é que a segurança na região já existia 82 anos antes da data de sua oficialização, que hoje se comemora a 5 de setembro de 1835. Ficou a dúvida, mas passamos a respeitar o que o governo provincial determinou através do seu Poder Legislativo, não obstante outras provas (registros) como este: “1776 - 24 de março – Antônio Ribeiro de Brito assassina a porretadas, Manoel de Oliveira Ferreira, Juiz Guarda Mor, e o Juiz de Fora, Dr Constantino Azevedo mandou uma escolta e 30 capitães do mato para prender o facínora que fugiu para Goiaz. O Governador Luiz de Albuquerque de Melo Pereira e Cáceres mandou o Sargento Mor Marcelino Camponez A FIM DE POLICIAR e estabelecer a ordem no lugar denominado Arraial do Araés onde se deu o crime”.(Datas Mato-Grossenses).

A indagação de Ubaldo Monteiro da Silva trouxe inspiração ao pesquisador a desvendar a gênese da Polícia fardada de Mato Grosso, e assim buscou-se através da produção científica uma legitimidade sólida e confiável da identidade institucional da Polícia Militar de Mato Grosso. Deste modo, o Tenente-Coronel da PMMT Wilame Alves de Almeida partiu para a construção da hipótese:

Porque atualmente é tido, como ponto pacífico, que a Polícia Militar do Estado de Mato Grosso tem sua origem atribuída a Lei nº 30, de 05 de Setembro de 1835, da Assembleia Legislativa Provincial de Mato Grosso, que criou o Corpo Policial denominado “Homens do Mato”, em substituição daquela denominada outrora de Guarda Municipal Permanente, sendo que há evidências históricas que asseveram a origem da Polícia Militar quando da atuação no desempenho de atividades policiais de garantia da Segurança da população mediante o estabelecimento e a preservação de uma Ordem Pública comum a todos os cidadãos, já no século XVIII durante o período colonial sob a denominação de Ordenanças?

Qual correlação do vocábulo Ordenanças com a missão e atuação da Polícia Militar nos dias atuais?

Busquemos no ensinamento de Hélio Moro Mariante em Crônica da Brigada Militar Gaúcha – pág. 35 ao relatar que:
Ao escrever-se a história das polícias militares do Brasil, no que diz respeito às suas origens, infalivelmente o pesquisador ou o historiador deve orientar suas buscas na gênese das forças armadas do país, pois que era por intermédio destas, principalmente nos elementos de suas 2ª e 3ª linhas, que se requisitava o pessoal para determinadas missões policiais, em virtude da inexistência, então, de órgãos encarregados, especificamente, do serviço de policiamento.

Desta maneira, a Força Armada da colônia brasileira era constituída de tropas de linhas, e torna-se, no presente contexto, conveniente explicar que o verbete 'linha', de acordo com Magalhães (1972), descreve:

A Primeira linha compreendia as forças permanentes, até a República, conhecida como tropas de linha: constituía-se com três armas: infantaria, cavalaria e artilharia. A segunda linha só compreendendo a infantaria e cavalaria, que correspondia os antigos auxiliares. Formava-se uma terceira linha, com a antiga organização dos ordenanças, compreendendo unidades de infantaria e cavalaria e alguns de caráter muito especial como companhia de chacareiros e forasteiros, a que pertenciam todos os não-alistados nas outras mencionadas linhas. As duas últimas formavam as milícias.(MAGALHÃES apud MARIANTE, 1972, p. 36,37).

Portanto, entende-se na pesquisa do historiador militar, ora mencionado, que a Polícia no Brasil surgiu ou originou-se das tropas de 2ª e 3ª linhas do Exército Brasileiro, constituídas por gente da terra, encarregada de preservar a ordem e, ainda, atuava como Força Auxiliar em defesa do território.

É comum constatar-se em documentários sobre as primeiras organizações militares de segunda e terceira linhas, o tratamento por sinônimos, até ocorrer uma certa confusão na compreensão e distinção das terminologias: Auxiliares, Milícias, Corpo de Quadrilheiros, Terços de Ordenanças, etc. Sem embargo, com o passar do tempo, Milícia passou a representar todas elas.

O Marquês de Lavradio, em seu relatório do período de 1769/1775, na parte respeitante as Milícias diz, a certa altura: “Tudo se conserva com muito maior sossego e são menos freqüentes as desordens e mais respeitantes as leis, o que mostra, claramente, que as citadas milícias eram as encarregadas do serviço de policiamento”.
            
A alta função destes Corpos (Milícias e Terços de Ordenanças), nos quais, a disposição de servir apresenta certa espontaneidade, onde não pode deixar de ser ressaltada, uma vez que estando eles distribuídos por todo território nacional, mesmo nas mais distantes províncias do Império, constituíram um fator de segurança para a nossa Sociedade.

Prestemos atenção que o Marquês de Lavradio no seu relatório acima citado explicita que os Corpos (Milícias e Terços de Ordenanças) eram encarregados do serviço de policiamento dos rincões do território brasileiro. Isso confirma mais uma vez que estas forças militares juntamente com outras nomenclaturas já citadas constituíam as forças militares incumbidas no serviço de policiamento durante o Brasil-colônia, onde, as contribuições destas forças militares no cumprimento de suas missões em prol da paz e da ordem pública, favoreceram ou contribuíram decisivamente para a formação da Sociedade Brasileira na era colonial.

De um modo geral, Mariante esclarece que se pode situar no tempo, até o advento da República, por ordem cronológica, a nomenclatura principal das instituições que executavam ou colaboravam no serviço de policiamento do Brasil: Ordenanças, Terços, Milícias, Municipais Permanentes e Guarda Nacional. Estas forças, segundo os tempos, recebiam reforços de dragões, caçadores, legiões e pedestres, entidades paramilitares, que desempenhavam funções policiais, a par de atribuições de defesa do território.

Portanto, a concepção de Ordenanças e as tropas com outras denominações ora citadas encarregadas do policiamento no Brasil representavam as forças policiais que reunidas mesmo esporadicamente para prevenir ou reprimir quando convocada, para garantia da lei e da ordem, quando a tranquilidade do Arraial, Vila ou Rincão viesse a ser perturbada ou ofendida. Nasce assim pelas tropas de linhas (2ª ou 3ª) a prática do policiamento, que constitui o início de uma conquista de fato, que as forças policiais encarregadas do policiamento obtiveram da sociedade no 2º quartel do século XVI. Quando referenda-se a locução substantiva conquista de fato nada mais é que a legitimidade da prestação de serviço da atividade de policiamento pelos Ordenanças na comunidade. Agora perquerimos: e a legalização? A legalização corresponde a normatização da referida atividade de policiamento por autoridades constituídas no tempo e no espaço.



MATO GROSSO: DE ORDENANÇAS À POLÍCIA MILITAR

Polícia e sociedade são inseparáveis, uma vez que para concretizar o nascedouro de uma vila, comunidade ou sociedade, o serviço da Polícia torna-se fundamental para evitar e gerenciar conflitos de toda espécie. Neste pensamento, busquemos ter noção de que forma o território de Mato Grosso foi conquistado e povoado, para afirmarmos que aqui no rincão Mato-Grossense a Polícia, como tropa de 2ª e 3ª linha, foi um organismo institucional do governo de vital importância na busca da tranquilidade pública e, ainda, desempenhou relevantes serviços na defesa do território de Mato Grosso.

A Polícia como tropa de linha, foi de extrema importância na defesa do território Mato-Grossense, e ainda, de fundamental valor na defesa de Cuiabá contra ataques indígenas e também contrapondo-se aos abusos e à violência nas minas.

Tudo isto, porque Cuiabá foi fundada em 8 de Abril de 1719, e a partir daí, surgiu a notícia que no solo cuiabano havia ouro e, por conseguinte, intensificaram-se as viagens para essa região, no intuito de explorá-la.

Constata-se nos ensinamentos de Assis (1998) que no Arraial do Cuyaba a população era formada por mineiros aventureiros, administradores, homens livres pobres e escravos. A violência fazia parte do cotidiano e era necessária a manutenção, mesmo que provisória, da presença de um governo capaz de coibir os abusos decorrentes da ganância de muitos mineiros e comerciantes de ficarem mais ricos, inclusive com prejuízo da Coroa Portuguesa, pois muitos fraudavam o fisco.

Neste contexto historiográfico apresenta-se parte da transcrição do documento histórico que aponta a legitimidade legal da gênese tricentenária da Polícia Militar Mato-Grossense, mediante a primeira ocupação de cargo com finalidade Policial-Militar em função de Comando com responsabilidade direta pela defesa local e preservação da ordem legal e administrativa no Arraial do Cuyaba, contida em Marques:

Termo que fizeram os primeiros exploradores que se acharam nas minas de Cuiabá. Hoje 6 de Novembro de 1720 se juntaram os moradores destas minas a praticar de que modo poderiam conquistar estas minas para exercitarem e trabalharem nelas, porquanto se acham grandes perigos de vários inimigos, tanto os castelhanos que têm suas conquistas nestas vizinhanças como também o muito gentio que são moradores nestas minas, os quais impedem, com suas mortes, assim de brancos como de escravos, e roubos mui grandes que lhes fizeram, deixando os homens desbaratados e desunidos, sem poderem tirar ouro para pagarem os reais quintos de Sua Majestade, que Deus guarde, consultaram um cabo maior para se poderem unir e terem resistência para continuarem em boa ordem estas conquistas por ser muito do serviço de Sua Majestade, que Deus guarde, e acordando acharam os ditos moradores e povo na pessoa do capitão-mor Fernando Dias Falcão todos os merecimentos necessários e toda a capacidade e ser das principais famílias da cidade de S. Paulo, muito opulento, e haver exercitado e ocupado muitos postos no serviço de Sua Majestade, que Deus guarde, e muito fidedigno para todo o bem comum, e assim o levantamos ao dito capitão-mor Fernando Dias Falcão para nosso cabo maior, para nos governar, e reger tudo o que se oferecer do bem comum do povo e do serviço de sua Majestade, que Deus guarde, e lhe prometemos guardar toda a obediência necessária. (...) ...este termo, o qual logo lhe deram posse do dito posto, e disse o cabo alterado que visto ser para o bem comum do povo e para o serviço de S. Majestade, que Deus guarde, que aceitava com grande gosto e que faria toda a sua obrigação necessária, bem e principalmente, assim como Deus o manda. Eu, Ignacio Preto de Moraes, como escrivão o escrevi. - João Leme da Silva, Lourenço Leme da Silva, Pedro Leme da Silva, Diogo Dias Vidigal, Antonio Ribeiro Pina, Francisco Coelho, Manoel Pereira Rios, Antonio Ribeiro de Proença, Antonio Moreira, Domingos Fernandes de Oliveira, Salvador Bicudo, Alberto Velho Moreira, João de Anhaia, Simão Rodrigues Moreira, Manoel de Oliveira Falcão, Theodozio Nobre, José Fernandes, Pedro Alves, Angelo Preto, José Antunes, Antonio Gonçalves, Manoel Garcia Velho. Ascenço Dias Leme, Domingos de Brito, João de Macedo Ribeiro, Gaspar dos Reis, Pedro Leite, José Fernandes, Antonio de Macedo, Gaspar Gonçalves Ribeiro, Bartholomeo de Brito, Francisco de Siqueira, Pedro de Godoy da Silva, Antonio de Almeida Lara, Thomé de Lara Falcão, José Paes de Almeida, Manoel Dias Leme, Antonio Antunes, Antonio de Moraes, Tristão de Oliveira, José Paes, Ignacio Preto de Moraes.

Com efeito, a fim de compor nova administração para o Arraial, conferiu a Fernando Dias Falcão a patente de Capitão-Mor Regente, em 1724, endossando nos moldes da legalidade prescrita pela Ordenação Real a legitimidade da votação realizada em 1720 pelos moradores de Cuiabá, para superintender a Polícia, as obras públicas, concorrendo com a Câmara e Juízes em todos os casos graves, exercitar funções de Polícia promovendo a quietação e sossego entre os povos evitando dissensões e inimizades, fazendo prisões para as quais todos eram obrigados a prestar auxílio, devendo como chefe local dos Ordenanças que todos os Oficiais e Soldados lhe sejam obrigados em obediência inviolável, formar os Regimentos a partir do recrutamento e escolha dos Soldados em listas levantadas semestralmente, e proporcionar favor e proteção aos ministros da justiça quando em funções podendo ainda denunciá-los quando omissos no cumprimento de seus deveres. A seguir, a transcrição do documento histórico que endossa a legitimidade legal da gênese de nossa Polícia Militar, mediante ocupação de cargo com finalidade Policial-Militar em função de Comando com responsabilidade direta pela defesa local e manutenção da ordem legal e administrativa no Arraial do Cuyaba, contida em Marques:

Natural de Parnahyba, filho de Antonio de Almeida Cabral e de D. Maria da Silva Falcão. Os serviços e mérito deste paulista constam da patente que abaixo transcrevemos, extrahida do liv. 1.º de registro de patentes da secretaria do governo de S. Paulo:
Rodrigo Cesar de Menezes, etc. Faço saber aos que esta minha carta patente virem que havendo consideração a se acharem as novas minas de Cuiabá com muitas pessoas e vários mineiros que tem concorrido para ellas com grande numero de escravos, assim para minerarem no que se acha descoberto, como para fazerem novas descobertas por se ter certeza da grande extensão d'aquelle sertão e dos haveres que n'elle se espera descobrir, mettendo-se de paz as nações de gentios que n'elle habitam; e ser preciso para o bom regimen das pessoas que se acham nas ditas minas, e para a expedição das ordens que se mandaram à ellas, serem executadas com tino e acerto e promptidão, nomear-se pessoa que haja de ocupar o posto de capitão-mór regente, em quem concorrem valor, respeito, prudência e conhecimento da disciplina militar, para que obrando em tudo com acerto seja promptamente obedecido. Tendo attenção a que todos esses merecimentos concorrem na pessoa de Fernando Dias Falcão de uma das principaes e mais nobres famílias desta Capitania, e haver servido à Sua Magestade que Deus Guarde, ha mais de vinte anos occupando os postos de capitão e sargento-mor de ordenanças e ultimamente a de capitão-mór da villa de Sorocaba, como também o de juiz ordinário e de orphãos da mesma villa, havendo-se com grande zelo na arrecadação dos bens e legítimos dos orphãos.

Passando às Minas-Geraes serviu no Pitanguy de juiz ordinário e dos orphãos, provedor das fazendas e limpeza de mãos e por ordem do capitão-general D. Braz Balthazar da Silveira creouvilla e levantou pelourinho em Pitanguy. Passando ultimamente às novas minas de Cuyaba socorreu à muitas pessoas que tinham ido adiante, e tinham invernado no caminho; levando-os em sua fazenda e chegando com effeito as ditas minas foi eleito pelo povo para capitão-mór regente dellas, onde assistiu cinco anos acommodando e pacificando o povo que andava revolto para não conseguirem forasteiros, tudo afim de que se continuasse aquelle descobrimento e fosse maior o augmento da real corôa. Applicando-se em todo o tempo que assistio n'aquelle sertão não só em descobrimentos de ouro mas em metter o gentio de paz e alimpar a campanha, para que os mineiros pudessem minerar livres de invasões, que costumam fazer os bárbaros, fazendo com isto grande serviço a Sua Magestade que Deus Guarde pelo augmento dos dizimos e quintos reaes; pois, só de sua parte pagou de quintos de ouro, que trouxe em o anno passado de 1723, doze libras e oitenta e quatro oitavas de ouro, etc. Fazendo um considerável dispêndio de sua fazenda com a conquista que fez do gentio das ditas minas do qual metteu muitos em paz, com evidente risco de vida, pondo-os em termos de se habitarem e de poder com mais desembaraço continuarem aquelles descobrimentos, em que se esperam achar muitos haveres, como tudo consta por certidões a mais papéis que me apresentou, e por esperar d'elle que d'aqui em diante etc. Dado nesta Cidade de S. Paulo aos 27 dias de Abril de 1724. O secretario do Governo Gervasio Leite Rabello a fez - Rodrigo Cesar de Menezes.

Após um mês e meio de sua chegada, Rodrigo César de Menezes, em 1º de Janeiro de 1727 eleva o Arraial do Cuyaba a categoria de Vila a qual passa a denomina-se Villa Real do Senhor Bom Jesus de Cuiabá. Conforme se vê em Canavarros, nos termos parciais da Ata alusiva ao evento, constata-se que ainda exercia o cargo de Capitão-Mor Regente Fernando Dias Falcão, tendo inclusive sido encarregado de levantar o pelourinho, posto este simbolizar o núcleo legal, e ser instrumento e símbolo de autoridade:
(...) nesta Villa Real do Senhor Bom Jesus de Cuiabá, sendo mandado por S.M., que Deus guarde, a crea-la de novo o Exmo. Sr. Rodrigo César de Menezes, governador e capitão-general desta capitania e que, (...) nomeou para levantar o pelourinho ao capitão-mor regente Fernando Dias Falcão, e todos sobreditos com o dito Dr. Ouvidor, nobreza e povo foram à praça desta Villa, aonde o dito Fernando Dias Falcão levantou o pelourinho, do que para constar a todo tempo fiz este termo, que assignou o dito Sr. General com todos os sobreditos.

De acordo com Assis, “anterior a chegada de Rolim de Moura na capitania de Mato Grosso, a militarização estava restrita à existência de duas companhias de ordenanças”.
Assim, Dom Rolim de Moura, com base nas instruções que lhes passara o Rei de Portugal, ampliou em mais nove, o número de Companhias de Ordenanças para atender a defesa e segurança da população do Coxipó, rio abaixo e rio acima que, conforme registro, temos nos anos de “1752 – Março: Criou-se uma Companhia de Ordenanças dos Homens Brancos; Agosto: Criou-se uma Companhia de Homens Prêtos"., registrado em Mendonça acha-se o seguinte:

03 de Março

1753. - O governador d. Antonio Rolim de Moura Tavares, depois conde de Azambuja e vice-rei do Brasil, organiza em Villa Bella uma companhia de ordenanças de homens pardos, com o effectivo de oitenta praças.

De um mapa enviado em 1769 á Secretaria dos Negócios Ultramarinos vê-se que a força pública existente na antiga capital era assim classificada:
Dragões 126 praças - Pedestres 122 praças - Ordenanças 372 praças
Esta última unidade era distribuída pela seguinte fórma:
Estado maior 3; Brancos 205; Pardos 80; Pretos forros 84 
Não excedendo naquella época a três mil o número de habitantes de Villa Bella, segue-se que o effectivo militar abrangia mais de 20% da população geral. O facto explica-se pela necessidade de manter a ordem na fronteira.


Ainda encontramos registrado que no ano de “1755 – Criaram-se em Cuiabá seis companhias de Ordenanças: duas na vila, uma no distrito de Cáceres, uma na Chapada, uma no Coxipó, uma no rio Cuiabá acima e outra no rio abaixo”.

No caso de Mato Grosso, as tropas encarregadas de proporcionar tranquilidade coletiva executando o serviço policial não foram criadas em 1835, mas tendo seu embrião nas Tropas de Ordenanças, possuíram dezoito nomenclaturas históricas diferentes, com 24 modificações ao todo, uma vez que no regime Regencial, no Segundo Império e no inicio do regime Republicano cada governo, entre as reformas que introduziam na Administração, incluíam a mudança do nome da Corporação: Ordenanças, Milícias, Guarda Nacional, Guarda Municipal, Corpo Policial (2 vezes), Força Policial (3 vezes), Corpo Policial Permanente, Guarda Provisória de Segurança Pública, Companhia de Pedestres, Secção de Companhia de Força Policial, Corpo de Voluntários da Pátria, Companhia Policial, Corpo de Polícia Militar, Batalhão de Polícia Militar, Força Pública (3 vezes), Batalhão da Força Pública, Força de Polícia Militar, até a denominação de Polícia Militar (2 vezes), a qual não mais pode ser modificada por lei estadual, perdura nos dias atuais. Em que pese as diferentes denominações históricas, fruto das tensas transições da História Brasileira mediante seus sintomáticos estágios em busca de valores do nosso Estado Contemporâneo, a Polícia Militar Mato-Grossense jamais mudou seu ideal: atuar no desempenho de atividades policiais de garantia da Segurança da população mediante o estabelecimento e a preservação de uma Ordem Pública comum a todos os cidadãos. Esse desiderato diuturno e incessante tem sido ininterrupto em cada um dos 365 dias de cada ano desde 1720 até nossos dias.

Para fechar a compreensão de todo contexto, fica a colaboração de Gilberto Cotrim ao afirmar: Estudar a história é adquirir consciência da trajetória humana. Consciência do que fomos para transformar o que somos. Neste precioso ensinamento o historiador muito bem esclarece que o estudo do passado e a compreensão do presente não se relacionam de forma estreita e determinista. Por isso que, sem o processo de recriação, que considere as mudanças nas condições políticas, econômicas e culturais, as experiências recolhidas do passado não se aplicam ao presente.

Nesta condição, pelo encontro da certidão de nascimento da Polícia Militar denominada outrora como Ordenança e com outras nomenclaturas ao longo do tempo, em tese, descobrimos o que fomos enquanto integrantes da Instituição (PMMT) que tivera seu serviço de policiamento em benefício do Arraial Mato-Grossense legitimado pelo povo e legalizado pelas autoridades da época. Assim a polícia fardada desde o período colonial vem atuando no seu mister de segurança preventiva até os dias atuais, onde a sua legalização garantida na maior lei do país (CF. 144, inciso V¸ § 5º) empolga cada vez mais a transformar o que somos como membros desta histórica Corporação que segue a sua trajetória de forma segura, competente e legalista, que amparada pela técnica, pelo conhecimento doutrinário de polícia preventiva, pela observância da ética e dos direitos humanos e ainda, alicerçado pelos pilares basilares da hierarquia e disciplina permite dessa feita preservar e garantir com profissionalismo a vida, a liberdade, a dignidade, e a defesa do patrimônio de todos os Mato-Grossenses que vivem, como diz Dom Aquino Corrêa: Nessa terra colosso, eldorado como outro não há.

Pela síntese de tudo que fora produzido fica a profunda compreensão, mediante a pesquisa historiográfica regional Mato-Grossense, das evidências históricas da origem da Polícia Militar do Estado de Mato Grosso, que passou a ter o reconhecimento de seu povo, através de seus representantes constituídos, mediante o sancionamento pelo Poder Executivo Mato-Grossense da Lei Estadual nº 9.768, de 28/06/2012, declarando o dia 06 de Novembro de 1.720 como data oficial da criação da Polícia Militar do Estado de Mato Grosso.



OSMAR LINO FARIAS – CEL QOPM

COMANDANTE GERAL DA PMMT



COLABORADORES:
PEDRO SIDNEY FIGUEIREDO DE SOUZA – CEL RR PMMT: É Graduado em História pela Universidade de Várzea Grande – UNIVAG/MT, Pós-Graduado com Especialização em História, Região e Fronteira pela Universidade de Várzea Grande – UNIVAG/MT, possui o Curso de Aperfeiçoamento de Oficiais/PMESP, Especialização em Gestão Organizacional de Segurança Pública/Altos Estudos – Curso Superior de Polícia/PM-MT e Universidade de Mato Grosso/UNEMAT, e-mail: celsidney@hotmail.com
WILAME ALVES DE ALMEIDA – TEN CEL PMMT: É Graduado em Pedagogia pelo Centro Universitário Cândido Mariano Rondon – UNIRONDON/MT, Pós-Graduado com Especialização em Direitos Humanos Internacional pela Universidade Federal de Alagoas e Amnistia Internacional, Especialização em Gestão de Segurança Pública – Curso de Aperfeiçoamento de Oficiais/PM-MT, Especialização em Política, Estratégia e Gestão – Associação dos Diplomados da Escola Superior de Guerra/MT, Especialização em Gestão Organizacional de Segurança Pública/Altos Estudos – Curso Superior de Polícia/PM-MT e Universidade de Mato Grosso/UNEMAT, e-mail: wilame@pm.mt.gov.br
ORIVALDO PERES BERGAS – MSc: É Graduado em Ciências Sociais (História, Geografia, Ciência Política) pela Faculdade Estadual de Educação Ciências e letras de Paranavaí – FAFIPA, em Paranavaí/PR, Bacharel em Direito pela Faculdade Afirmativo – FAFI, em Cuiabá/MT, possui Mestrado em Agricultura Tropical pela Universidade Federal de Mato Grosso na Faculdade de Agronomia e Medicina Veterinária – UFMT/FAMEV, em Cuiabá/MT, Mestrado profissional em Educação, Sociedade e Psicanálise pelo Instituto Superior de Educação e Teologia – INSET, em Itanhém/SP, possui Especialização em Metodologia de Ensino Superior pela Fundação Getúlio Vargas – FGV, no Rio de Janeiro/RJ, Especialização em Metodologia de Pesquisa pela Fundação Getúlio Vargas – FGV, no Rio de Janeiro/RJ, Doutorando em Educação pela Universidade de Wisconsin/USA, e-mail: professorbergas@hotmai.com


REFERÊNCIAS:

AGUIRRE, Elizabete. Apostila da Disciplina Metodologia da Pesquisa.Univag: Várzea Grande. MT. 2005. In: SOUZA, Pedro Sidney F. Uma abordagem histórica do processo de criação, formação e recrutamento do corpo policial “Homens do Mato” na província de Mato Grosso. Monografia. Univag. Várzea Grande: 2006.

ALMEIDA, Wilame Alves. Polícia Militar do Estado de Mato Grosso: Revisão Legal de Sua Legitimidade na História Mato-Grossense. Artigo Científico apresentado como requisito necessário à conclusão do Curso de Gestão Organizacional de Segurança Pública – CSP – 2011. (Disponível na Biblioteca da Academia de Polícia Militar Costa Verde, Várzea Grande - MT).

ASSIS, Edevaldo de. Cuiabá Colonial: Povoação e Sociedade. Cuiabá: Barros. 1998.
BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil: Texto constitucional promulgado em outubro de 1988, com alterações adotadas pelas Emendas Constitucionais de Revisão nº 1 a 6/94 – Brasília: Senado Federal, Subsecretaria de Edições Técnicas, 2005.

CANAVARROS, Otávio. O poder metropolitano em Cuiabá (1727 – 1752).Cuiabá: EdUFMT, 2004.

COTRIM, Gilberto. História Global- Brasil e Geral. 5ª Edição. Saraiva: São Paulo: 1999.

FREITAS, Moacyr.História Ilustrada de Cuiabá: “Dias difíceis nos arraiais”. Cuiabá: Gráfica UFMT, 1992.

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MARIANTE, Hélio Moro. Crônica da Brigada Militar Gaúcha. Este livro foi impresso na Imprensa Oficial. RS. 1972.
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